mimiMíDI

Religião expõe as falhas dos seus criadores

Eu não sou ateu. Acredito em Deus – claro que não no Deus descrito na Bíblia, o Deus do ódio (Velho Testamento) e do amor (Novo Testamento). Não poderia acreditar nesse Deus por um motivo simples: não acredito nem um pouco em Bíblia.

O meu Deus não é esse ser bíblico que exige adoração e devoção em tempo integral. Também não exige temor. Pelo contrário, é uma força superior que me traz conforto e não medo. Quero meu Deus sempre perto de mim, dentro de mim. Se o temesse, iria desejá-lo distante – quanto mais longe, melhor, como tudo pelo que sinto temor nesta vida.

Ele não vive me ameaçando com uma entidade indefinida chamada “inferno”. Tampouco perde o seu tempo concorrendo com essa coisa bisonha que chamam por aí de diabo. O meu Deus existe porque tem que existir. Eu o sinto quando olho para o céu, observo o universo. E o que vejo ao olhar para cima? O caos.

Isso mesmo, para mim o universo é um caos, mas é um caos organizado, que funciona. Em sendo assim, alguma coisa ou alguém – uma força superior que foge à minha compreensão – tem que organizar e fazer esse universo funcionar. E eis que, para mim, surge Deus.

Voltando à terra, penso ser altamente disfuncional essa relação umbilical que se criou entre Deus e religião. Deus é Deus – superior, incompreensível, intangível, inexplicável, espiritual – e religião é religião – terrena, mundana, material e, sobretudo, humana.

Em sendo humana, a religião é uma entidade revestida de falhas e à mercê das imperfeições daqueles que as conduzem. E tem como norteadora um livro (a Bíblia) pré-medieval, tão humano e material quanto a própria religião. A Bíblia não é entendida pelo cristão como “um livro”. Ela vai além: é “revelação”. O desafio consiste em mostrar aos que nela crêem que a Bíblia é um código de conduta.

Se para o cristão a Bíblia é uma revelação, para mim não passa de um código de conduta compilado para direcionar o comportamento humano (principalmente o ocidental) no sentido de uma obediência cega e convenientemente manobrável pelo “status quo”. Não à toa, o filósofo francês, Louis Althusser, classificou a igreja, a religião e os seus ensinamentos baseados no texto bíblico como “aparelho ideológico de Estado”.

Trata-se de um assunto tabu que as pessoas preferem não tocar, ou tendem a não se interessar por causa de suas defesas “naturais”.

Tem a igreja também. O líder espiritual da igreja cristã é Jesus – um homem que idealizou uma narrativa supostamente sagrada (há controvérsias, existem os que, como eu, acreditam numa narrativa mais revolucionária do que sagrada em Jesus) e a proferiu no campo, nas ruas, nos morros e montanhas, nas praias, enfim, o suposto “filho do homem” jamais precisou de um suntuoso templo para levar a termo a sua obra durante a sua relativamente breve passagem por esta terra.

A única vez que se tem notícia de Jesus em um templo foi para colocá-lo abaixo, dado o grau de profanação imputado àquele ambiente por mercenários.

Como dito anteriormente, acredito em Deus e o Deus no qual acredito me propicia a possibilidade de um diálogo direto entre Ele e eu, seja em palavras por meio de minhas orações, seja em puro e simples pensamento.

A minha relação com Deus independe de intermediários – principalmente da intermediação de uma entidade como a igreja, cujos valores propagados aos quatro ventos não são exatamente os mesmos que a norteia e aos seus líderes na vida cotidiana, no mundo real e material.

A história da igreja a condena por antecipação, seja ela milenar, como a católica, seja ela secular, como a protestante. É inquestionável o valor de alguns ensinamentos da igreja nos campos da moral e da ética, com fundamentos na tradição judaico-cristã que influenciou, entre outras coisas, o direito em praticamente todo o mundo ocidental.

Apesar de ser possível apontar um ou outro aspecto positivo aqui e ali na religião, se tem uma coisa pela qual agradeço ao meu Deus todos os dias de minha vida, é pelo fato de me ter criado um homem livre das amarras de toda e qualquer denominação religiosa. Obrigado, meu Deus, por não ter me feito escravo da religião.

 

Marcus Fiori é jornalista e professor de Jornalismo na Universidade Federal de Rondônia (UNIR).

midi

MíDI - Laboratório de Mídias Digitais e Internet

Pular para o conteúdo