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Professores universitários se sobrecarregam com mais funções

A nova cobrança é que os docentes de ensino superior sejam divulgadores científicos, além de professores, pesquisadores, extensionistas e gestores administrativos. O questionamento aumentou desde que os influenciadores digitais têm ocupado os espaços que estavam nas mãos dos jornalistas, profissionais treinados para realizar a tradução de fatos, inclusive os científicos. A exigência, no entanto, não apareceu apenas durante a pandemia da COVID-19, quando as aulas foram suspensas na maioria das instituições públicas de ensino superior do país e do mundo.

O ensino é apenas uma das atividades que cabem aos professores das universidades públicas brasileiras. Em tempos atuais, provavelmente, é a função que menos exercessem no cotidiano. Essas instituições adquiriram outros dois papeis que lhe dão sustentação: pesquisa e extensão. A produção do conhecimento científico e a aproximação com a comunidade se tornaram obrigações dos afazeres dos docentes. Além desse tríade basilar das universidades, acumulam serviços administrativos, dividindo-os com os servidores técnicos, e trabalhos como pareceres, relatórios, prestação de contas, entre outros.

A exigência pela propagação adequada do conhecimento científico desconsidera o que os professores universitários já realizam em seu ofício, inclusive com a circulação dos resultados das pesquisas em eventos para esta finalidade e em entrevistas, mesas redondas, debates públicos e afins. Essa nova cobrança, todavia, não é recente e surge de diversos setores sociais e espectros políticos. Quem está mais à direita assevera que há excesso de investimento público para esse nível de formação, em detrimento do retorno obtido. Mais à esquerda, argumenta-se que estes profissionais estão distantes da população, em virtude de uma arrogância científica.

De um lado ou de outro, pouco se pontua qual é, realmente, a expertise e o ofício dos professores das universidades, para que, de fato, serve esta instituição e, principalmente, quem deveria difundir o conhecimento científico. Se os jornalistas não assumem o papel de propagar as pesquisas produzidas, há problema que essa função seja assumida por influenciadores digitais? É certo que essa mediação seja realizada por quem possui melhores competências comunicacionais e que sejam cobrados investimentos nesse sentido, inclusive, nas instituições de ensino superior. Porém, que mais essa obrigação não recaia sobre os professores.

Esse acúmulo de funções possui uma relação intrínseca com a romantização da profissão, que parece, muitas vezes, uma das que mais exigem amor e doação. O professor brasileiro é visto como um herói, provavelmente da Marvel, pois, não coincidentemente, em algum momento da vida, foi “picado pelo mosquito” para escolher a profissão, ou ser escolhido por ela, como dizem os mais apaixonados. Essa analogia como super-humano não se aplica necessariamente aos docentes universitários. Embora também sobrecarregados, eles possuem, de maneira geral, melhores condições de trabalho e, principalmente, remuneração, em comparação aos colegas que lecionam nas escolas públicas municipais e estaduais de ensino fundamental e médio.

 

Allysson Martins é jornalista, professor e pesquisador do MíDI – Grupo de Pesquisa em Mídias Digitais e Internet da Universidade Federal de Rondônia (UNIR).

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MíDI - Laboratório de Mídias Digitais e Internet

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