mimiMíDI

Convicção e oportunismo poderiam guiar eleição em Vilhena

Se eu fosse candidato a prefeito de Vilhena, iria encampar um intransigente discurso anti-bolsonarista na campanha. Não só por convicção mas, principalmente, por oportunismo político. Por puro cálculo. Ao fazer isso minhas chances de vencer cresceriam geometricamente. A matemática (da mais simples) explica.

Na eleição presidencial de 2018, Jair Bolsonaro levou 81,31% dos votos vilhenenses no segundo turno. Isso não significa que 81,31% dos vilhenenses sejam bolsonaristas. Nessa época a escolha recaia em Bolsonaro ou Lula (personificado na figura de Fernando Haddad). Em 2020, não existe nem Lula nem lulismo, nem PT nem petismo. Desse percentual de eleitores locais que escolheram Bolsonaro, parte significativa deram um voto “anti-Lula”, e não “pró-Bolsonaro”. A prova dessa tese? Eu. Você que me lê consegue enxergar algum traço do bolsonarismo em mim? (Por favor, não me ofenda!).

Fazendo um cálculo mental rápido e tendo por base as pessoas com as quais convivo no dia a dia, diria que pelo menos 20% dos 81,31% daqueles que votaram em Bolsonaro em 2018 tiveram como elemento motivador o outro lado da contenda (lulismo/petismo). Não existindo esse fator, é mais fácil eu ganhar sozinho na Mega-Sena do que votar em Bolsonaro (essa chance anula-se no fato de que não faço apostas em casas lotéricas).

Isso posto, e pela experiência que tenho em participação em campanhas políticas na condição de jornalista, eu diria que pelo menos 20% dos eleitores de Jair Bolsonaro não votariam mais nele hoje. Desencantaram-se com o capitão Cloroquina. Multiplicam-se (também geometricamente) os motivos para que isso aconteça.

Suas atitudes (as do capitão Covid) em defesa do fechamento do Supremo e do Congresso, seu flerte constante com o autoritarismo, o seu fracasso em liderar a crise do coronavírus através do negacionismo científico, a tragédia ambiental que vivemos e que poderia ser evitada através de políticas de Estado (que Jair deveria liderar), as fortes suspeitas de desvios éticos por parte de todo o clã Bolsonaro (até a primeira dama entrou na dança), as evidências de ligação da família com milicianos cariocas. Enfim, eu poderia passar o dia aqui elencando barbáries promovidas por Jair e família, isso tudo deram uma nova perspectiva de seu governo ao eleitorado brasileiro – e o de Vilhena não é excessão à regra.

Se meu cálculo estiver certo, Bolsonaro manteria no cabresto cerca de 40% do eleitorado vilhenense – isso para ele, pois o seu poder de transferir votos para candidatos apoiados é uma incógnita. Os números do Rio de Janeiro são bastante desalentadores, pois há fortes indicações de que o seu candidato à reeleição, Marcelo Crivella, nem chegará ao segundo turno na eleição de novembro. Ou seja, o “tsunami Bolsonaro” de 2018 não passa de uma marola em 2020.

E a atribuição desses 40% é uma generosidade que leva em conta o caráter fortemente conservador, evangélico, da população de Vilhena, que se alinha ainda às raízes econômicas ligadas ao agronegócio (esse sim, um setor que não tem do que reclamar do bolsonarismo). Temos cinco candidatos a prefeito de Vilhena, quatro dos quais encontram-se com as cordas do bolsonarismo envoltas em seus pescoços e atadas com nó de marinheiro. Que eles lutem por esses 40% do eleitorado bolsonarista.

Ninguém precisa falar em alto e bom tom que “eu sou anti-bolsonarista” (se bem que eu falaria com prazer e convicção, sem oportunismo algum). Basta dizer que não vai tratar o meio ambiente de Vilhena como Bolsonaro trata a Amazônia e o Pantanal. Que vai levar a crise do coronavírus a sério, com respaldo médico-científico. Que vai tratar as instituições com o respeito que a democracia exige, e não com discurso e atitudes fascistas. Que não vai esfacelar a educação municipal como faz Bolsonaro com a educação federal. Que não vai colocar no comando da Secretaria de Saúde alguém completamente leigo e alheio ao setor. Que vai promover a nova política sem vender a alma ao diabo ainda no início da jornada. Enfim, é só elaborar uma plataforma de governo oposta à do presidente Corona – que, a bem da verdade, não tem plataforma alguma.

Voltando à tese que deu origem a esse texto, eu buscaria capitanear o sentimento anti-bolsonarista (em sendo político, por convicção e oportunismo) e ver o que acontece. Tem um grande público eleitor que encontra-se órfão no momento, tende a votar em candidatos “A” ou “B” pela mais pura falta que ora se apresentam no tabuleiro político. Eu não ficaria em cima do muro. Eu monstraria a que vim. Pior do que ser do lado de cá ou do lado de lá é não ter lado. É ficar pendurado num belo e confortável muro. A isso damos o nome de “omissão”.

 

Marcus Fiori é jornalista e professor de Jornalismo na Universidade Federal de Rondônia (UNIR).

midi

MíDI - Laboratório de Mídias Digitais e Internet

Pular para o conteúdo